25 Nov 2024
29/10/2011 - Café da manhã
Acendeu a luz pelo costume da claridade. Com passos arrastados, atravessou a cozinha e abriu as janelas, deixando que o forte sol matinal invadisse o ambiente. Retornou e deixou que a mão caísse sobre o interruptor, desligando a lâmpada sem alterar a luminosidade da área. Ficou parado ali por mais alguns instantes. Seu corpo e sua mente não haviam acordado por completo e aproveitavam cada oportunidade para parar e voltar a dormir.
Reuniu todas as forças que tinha e preparou um forte café. Percorreu os armários e a geladeira atrás de acompanhamentos e frutas, e postou um completo e incrivelmente simétrico banquete para seu desjejum.
Sentou na extremidade de uma larga e comprida mesa retangular, de costas para a janela para não se cegar com a luz que entrava por ela e poder ficar a vontade. Além disso, desfrutava de uma boa brisa por trás e uma agradável contra corrente de ar provocada pelos armários próximos. Ainda podia ver todas as outras cadeiras. Estava no centro e na extremidade ao mesmo tempo. Aquele, definitivamente, era o melhor lugar.
Por último, colocou os talheres cuidadosamente ao lado do prato vazio e passou a mexer e remexer no que estava sobre a mesa para garantir a simetria. Após alguns minutos na tarefa desnecessária desistiu e decidiu começar a comer, mesmo um pouco descontente com a diferença de cores entre o pote de geléia e manteiga (que dividiam o centro da mesa). Serviu-se com o máximo de cuidado para manter a posição das coisas, relaxou e deixou sua mente voar a cada pedaço de pão.
As memórias, favorecidas pelo ambiente a sua volta, o levaram a uma festa de natal que ocorrera há muitos anos. Aquela ainda era a casa de seus pais e podia entregar-se às futilidades da infância. Os cômodos estavam cheios de parentes e amigos que comiam e bebiam e diversas crianças corriam por todos os lados. O prazeroso caos tradicional de fim de ano.
Como sempre, cuidava de realinhar e redistribuir os copos, bebidas e doces conforme estes eram consumidos. A mesa (que agora recebia seu desjejum) permanecia com as guloseimas devidamente equilibradas e distribuídas, com o mínimo de falhas que era possível. Afinal, ainda era jovem, não podia se forçar tanto. Se ainda houvesse este tipo de reunião na casa a organização estaria perfeita.
- Uma moeda por seus pensamentos. - Seu déjà vu foi interrompido por uma doce voz que lhe saudava.
Parada à porta, uma linda moça de cabelos e olhos castanhos olhava fixamente para ele. O corpo dela estava coberto apenas por uma curta camisa regata cinza e uma discreta calcinha, deixando suas pernas sensualmente a mostra.
- Apenas voltei alguns anos no tempo.
- Hmm - Balbuciou a jovem, indo se sentar na cadeira que estava livre logo à esquerda, próximo ao jovem. - Nostalgia nunca foi muito seu perfil.
- Vejo que você não me conhece mais tão bem. Antigamente nem precisaria te dizer em que pensava.
- Você me afastou, fez com que me afastasse de você. Acreditou nas histórias e conselhos de sua família e deixou de falar comigo. Já faz muitos anos.
- E eu ainda não acredito que voltei a vê-la. Devo estar muito desesperado.
A jovem lançou-lhe um olhar agressivo, bufou e ficou encarando-o por alguns instantes antes de apoiar sua mão docemente sobre a do jovem. Este até pensou em recuar, mas hesitou.
- Muita coisa aconteceu. - tentou reconfortar a jovem.
Havia muita verdade embarcada naquelas palavras. Muita coisa acontecera nos últimos dias. A vida pacata e doce deixou de existir e um caos assumiu o lugar. Nunca sua mente esteve em um turbilhão tão intenso e as coisas só pareciam piorar. Não havia uma luz no final daquele túnel, apenas escuridão.
Igor Castañeda Ferreira
26 Out 2024
15/09/2011 - Um corvo me disse uma vez:
Estude, leis, questione, aprenda a ir atrás da solução de seus problemas. Tente encontrar a paz de seu espírito na plenitude da resolução. Mas, não se perca em si. Divirta-se, tenha e faça momentos memoráveis. Jogue-se em horas perdidas com “nada”.
Tenha amigos. Mesmo que poucos. Mas, verdadeiros. Você perceberá que não se é nada, nem ninguém, sem eles. Saiba que o mais importante na vida é saber que aqueles que te amam estão e sempre estarão ao seu lado. Uma motivação para todo sofrimento.
A família é a máxima da felicidade. Não só os ditos “parentes”, mas todos que te fazem sorrir com uma simples lembranças ou apenas em ouvir seus nomes. Não se está sozinho no mundo. E são essas faces que abraçarão seu coração em um terno sentimento chamado saudade.
Seja humilde, forte, esforçado e dedicado. O altruísmo é o que sustenta uma real sociedade. Busque sua tranquilidade, mesmo que essa esteja imersa em caos. Saiba que encontrará a felicidade no amor. E, para esse amor, entregue-se, mesmo que doa. Não se arrependerá de ter “vivido a eternidade” nos braços de outra pessoa.
Ao cumprir tais objetivos, seja forte. Aproveitarão de você. Lhe farão sofrer. Sua confiança será quebrada e seu coração amassado como papel. Maus tempos virão! E, com toda certeza, passarão.
Finalmente, uma coisa asseguro-lhe: “Não há fórmula para a felicidade”. Graças a Deus. Isto porque ela está em cada momento, a cada segundo. Nos olhos de quem se ama, no abraço do reencontro, nas lágrimas de um adeus… Cabe a você vê-la.
Igor Castañeda Ferreira
24 Out 2024
15/08/2011 - Homesick
Aqui faz muito frio. Muito mais do que eu imaginava. Saí para buscar lenha hoje cedo e mal consegui atravessar a rua sem que meu nariz congelasse. É algo anormal.
As crianças entraram de férias ontem. As ruas estão felizes agora. Um pouco de cor corre entre o branco e cinza. Parece que não vejo o sol há meses. É muito bom poder acompanhar tanta alegria através de minha janela, com um copo de chocolate quente nas mãos.
Apesar de só nevar no fim do dia, venta muito. Muitas foram as vezes em que precisei sair de casa com vários casacos, cachecol, gorro e luvas. Tudo isso para me proteger desse ar cortante de inverno. Os meus colegas ficaram me satirizando por muito tempo. É estranho vestir tanta roupa assim.
Ano passado eu estava aí, na praia. Outro mundo, que agora venero e desejo. Sinto muita falta desse calor dos infernos. Meus vizinhos falam que não está tão frio assim e que em julho faz muito calor. É triste, parece que vou ter de usar blusa até no verão.
Agora um monte de gnomos estão jogando bolas de neve na minha janela. Estou com vontade de me juntar a eles e realizar aquele sonho de infância, mas fico com preguiça de ir lá fora. É um momento mito dúbio este que vivo.
Alcancei um momento onde qualquer coisa me faz lembrar de casa. Uma árvore que se parece com aquele em frente de casa. A música que sempre nas rádios daí. Cheiro de feijoada baiana… É incrível a mente começa pregar peças quando temos saudade.
Algumas noites atrás eu sonhei que desembarcava na cidade, abraçava você, meus pais e meus irmãos. Foi tão real. Fiquei bem triste quando percebi que ainda estava nessa cama vazia. Estou sentindo muito sua falta. É normal para mim me pegar pensando em nossos passeios no parque.
Acho que você amaria estar aqui. Tem muitas árvores. Tudo é calmo. A casa é bonita e as pessoas são simpáticas. É um ótimo lugar para se estar e morar, quando se tem alguém para dividir as refeições.
Ainda estou com aquela corrente que você me deu. Não tive coragem de tirar. Esteve comigo todo esse tempo e me deu muita sorte. Espero que esteja torcendo por mim, rezando por mim, lembrando de mim… É o que me faz querer ir trabalhar de manhã, em vez de rumar para o aeroporto.
Amanhã vou à cidade vizinha para visitar um cliente em potencial. Meu chefe arranjou um carro para nós e falou que irei dirigi-lo. Imagina emoção de cruzar estradas desconhecidas. É um trote para os “recém-exportados” (como eles chamam por aqui): levar o chefe, sem mapa e sem celular.
Até parece um filme de terror brega. Só que sem a mocinha para salvar e sem o mocinho querendo aparecer. Só um carro rumado na neve rumo e sem comunicação. O pacote completo da solidão. É, realmente, um bom trote.
Atrás dessa carta vai uma foto com um cachorro que encontrei pela vizinhança. Meu mais novo companheiro de estadia. Ele é lindo. Pode ser que, talvez, leve-o comigo. Ver se o pequeno suporta calor com tanto pelo. É… Acho que é tudo por hoje.
Abraços,
Igor Castañeda Ferreira