Escrita de outrora - Um corvo me disse uma vez

15/09/2011 - Um corvo me disse uma vez:

Estude, leis, questione, aprenda a ir atrás da solução de seus problemas. Tente encontrar a paz de seu espírito na plenitude da resolução. Mas, não se perca em si. Divirta-se, tenha e faça momentos memoráveis. Jogue-se em horas perdidas com “nada”.

Tenha amigos. Mesmo que poucos. Mas, verdadeiros. Você perceberá que não se é nada, nem ninguém, sem eles. Saiba que o mais importante na vida é saber que aqueles que te amam estão e sempre estarão ao seu lado. Uma motivação para todo sofrimento.

A família é a máxima da felicidade. Não só os ditos “parentes”, mas todos que te fazem sorrir com uma simples lembranças ou apenas em ouvir seus nomes. Não se está sozinho no mundo. E são essas faces que abraçarão seu coração em um terno sentimento chamado saudade.

Seja humilde, forte, esforçado e dedicado. O altruísmo é o que sustenta uma real sociedade. Busque sua tranquilidade, mesmo que essa esteja imersa em caos. Saiba que encontrará a felicidade no amor. E, para esse amor, entregue-se, mesmo que doa. Não se arrependerá de ter “vivido a eternidade” nos braços de outra pessoa.

Ao cumprir tais objetivos, seja forte. Aproveitarão de você. Lhe farão sofrer. Sua confiança será quebrada e seu coração amassado como papel. Maus tempos virão! E, com toda certeza, passarão.

Finalmente, uma coisa asseguro-lhe: “Não há fórmula para a felicidade”. Graças a Deus. Isto porque ela está em cada momento, a cada segundo. Nos olhos de quem se ama, no abraço do reencontro, nas lágrimas de um adeus… Cabe a você vê-la.

Igor Castañeda Ferreira

Escrita de outrora - Homesick

15/08/2011 - Homesick

Aqui faz muito frio. Muito mais do que eu imaginava. Saí para buscar lenha hoje cedo e mal consegui atravessar a rua sem que meu nariz congelasse. É algo anormal.

As crianças entraram de férias ontem. As ruas estão felizes agora. Um pouco de cor corre entre o branco e cinza. Parece que não vejo o sol há meses. É muito bom poder acompanhar tanta alegria através de minha janela, com um copo de chocolate quente nas mãos.

Apesar de só nevar no fim do dia, venta muito. Muitas foram as vezes em que precisei sair de casa com vários casacos, cachecol, gorro e luvas. Tudo isso para me proteger desse ar cortante de inverno. Os meus colegas ficaram me satirizando por muito tempo. É estranho vestir tanta roupa assim.

Ano passado eu estava aí, na praia. Outro mundo, que agora venero e desejo. Sinto muita falta desse calor dos infernos. Meus vizinhos falam que não está tão frio assim e que em julho faz muito calor. É triste, parece que vou ter de usar blusa até no verão.

Agora um monte de gnomos estão jogando bolas de neve na minha janela. Estou com vontade de me juntar a eles e realizar aquele sonho de infância, mas fico com preguiça de ir lá fora. É um momento mito dúbio este que vivo.

Alcancei um momento onde qualquer coisa me faz lembrar de casa. Uma árvore que se parece com aquele em frente de casa. A música que sempre nas rádios daí. Cheiro de feijoada baiana… É incrível a mente começa pregar peças quando temos saudade.

Algumas noites atrás eu sonhei que desembarcava na cidade, abraçava você, meus pais e meus irmãos. Foi tão real. Fiquei bem triste quando percebi que ainda estava nessa cama vazia. Estou sentindo muito sua falta. É normal para mim me pegar pensando em nossos passeios no parque.

Acho que você amaria estar aqui. Tem muitas árvores. Tudo é calmo. A casa é bonita e as pessoas são simpáticas. É um ótimo lugar para se estar e morar, quando se tem alguém para dividir as refeições.

Ainda estou com aquela corrente que você me deu. Não tive coragem de tirar. Esteve comigo todo esse tempo e me deu muita sorte. Espero que esteja torcendo por mim, rezando por mim, lembrando de mim… É o que me faz querer ir trabalhar de manhã, em vez de rumar para o aeroporto.

Amanhã vou à cidade vizinha para visitar um cliente em potencial. Meu chefe arranjou um carro para nós e falou que irei dirigi-lo. Imagina emoção de cruzar estradas desconhecidas. É um trote para os “recém-exportados” (como eles chamam por aqui): levar o chefe, sem mapa e sem celular.

Até parece um filme de terror brega. Só que sem a mocinha para salvar e sem o mocinho querendo aparecer. Só um carro rumado na neve rumo e sem comunicação. O pacote completo da solidão. É, realmente, um bom trote.

Atrás dessa carta vai uma foto com um cachorro que encontrei pela vizinhança. Meu mais novo companheiro de estadia. Ele é lindo. Pode ser que, talvez, leve-o comigo. Ver se o pequeno suporta calor com tanto pelo. É… Acho que é tudo por hoje.

Abraços,
Igor Castañeda Ferreira

Escrita de outrora - Uma noite de baile

16/07/2011 - Uma noite de baile

- Para de frescura e vem logo pra cá menina. - Ordenou a mãe em um misto de impaciência com curiosidade e entusiasmo.

A filha saiu do banheiro a passos miúdos. Seus longos cabelos castanhos estavam presos por uma faixa lilás, mas ainda voavam soltos a cada passo. Sua pele branca ardia em um rubor tímido e seus olhos miravam o chão.

Quando levantou o rosto e recebeu o olhar maravilhado de sua progenitora cobriu o rosto com as mãos e soltou um gemido de alguém que irá cair em prantos.

- Deixa disso querida! Você está linda. - A mão abraçou a filha e a conduziu até um banco defronte a um espelho.

Aquela frase não era irreal. O longo vestido lilás passava a poucos centímetros do chão graças à sandália de salto alto, o corpete preto apertava e ressaltava os seios e uma faixa apertava a barriga se fechando em um luxuoso e discreto laço nas costas. Mesmo faltando a maquiagem e os últimos toques no cabelo, a jovem (acostumada a andar de jeans e camiseta) já possuía um brilho majestoso e encantador.

Sua aflição aumentava a cada passo do relógio, seu estômago não a deixava em paz há muito tempo e o sorriso bobo de sua mãe piorava tudo. Devia estar ridícula naquele vestido, mas gostava, o que a deixava mais nervosa. Era um sinal que gostava de ser ridícula.

Base, rímel, sombreador, delineador, batom e o quadro ia ficando cada vez mais belo. O espelho parecia emoldurar uma pintura que ia sendo trabalhada naquele momento por um grande artista. Queria que suas amigas estivessem ali com ela, seria muito legal acompanhar essa mudança em todas elas, mas percebeu que seria mais divertido ainda ver as caras surpresas quando ela entrar pelas portas do salão.

- Não mãe, por favor! Deixe meus cabelos soltos! - Gesticulou em súplica. Estava muito bonita, mas não podia se dar ao luxo de sair exibindo as orelhas, eram muito feias.

Depois de uma pequena discussão a mãe a convenceu a, pelo menos, ajeitá-lo em um penteado mais elaborado. A expectativa fez com que parecesse uma eternidade, mas o resultado foi glorioso.

A maquiagem mais clara trazia luz que, abraçada pela cor cabelo, ressaltava a beleza de seu rosto fino e arredondado. Seus belos olhos destacavam-se ao conjunto harmonioso com um brilho jovial, assim como o discreto sorriso que chegara à sua face e ficara.

O pequeno desconforto, o medo e o embrulho no estômago voltaram quando a mãe bateu as mãos e anunciara que havia terminado. Era hora de descer as escadas e ser envergonhada por seu pai que, com certeza, estaria com a máquina fotográfica e falaria algo besta. Mas o pior seria ter de aturar a peste do irmão mais novo que caçoaria, mesmo ela estando fabulosa.

No trajeto, percebeu que as escadas da casa eram maiores do que ela imaginava, parecia que nunca terminavam. Milhares de coisas passaram por sua cabeça. Desistir foi um a palavra mais recorrente, junto com as milhões de desculpas esfarrapas. Algumas até eram boas, mas estava tão nervosa que nem reparou.

Ao chegar na sala o silêncio que se fez foi pior do que qualquer besteira ou brincadeira. Precisava ouvir uma opinião sincera e, mais do que isso, precisava ouvir que estava linda.

Foi exatamente o que ouviu, mas só a fez corar como nunca, aumentar sua aflição e só conseguir ficar parada porque suas pernas não respondiam (seu desejo era correr como nunca, para onde, não sabia).

A causa não foi o elogio, mas a voz que o fez. Seu companheiro para aquela noite estava sentado em uma poltrona próxima ao pai, jogando videogame com o irmão caçula.

O jovem levantou, abotôo o smoking, ajeitou a gravata borboleta e se aproximou para receber a moça. A maestria do movimento o deixou ainda mais elegante e belo, como se não bastassem os olhos claros, os cabelos loiros e o corpo esbelto.

Com certeza aquela seria uma noite espetacular.

Igor Castañeda Ferreira